"E ela repetia que não poderia viver e não viveria sem ele, e ambos repetiam um ao outro essas palavras e repetiram-nas tão longamente que acabaram por sucumbir a um grande fascínio brumoso; tinham tirado a roupa e estavam a amar-se; de repente. Jaromil sentiu na mão a humidade das lágrimas que escorriam pelo rosto da ruiva; era maravilhoso, era uma coisa que nunca lhe acontecera, uma mulher a chorar por amor dele; as lágrimas eram para Jaromil essa substância na qual o homem se dissolve quando não quer contentar-se com ser um homem e deseja libertar-se dos limites da sua natureza; parecia-lhe que o homem, por meio de uma lágrima, escapava à sua natureza material, aos seus limites, que se confundia com a lonjura e se tornava imensidade. Estava formidavelmente comovido pela humidade das lágrimas, e sentiu de súbito que também ele estava a chorar; amavam-se e estavam molhados por todo o corpo e por todo o rosto, amavam-se e a verdade é que estavam a dissolver-se, os seus humores misturavam-se e confluíam como as águas de dois rios, choravam e amavam-se e nesse instante estavam fora do mundo, eram como um lago que se desprendesse da terra e se elevasse para o céu."
Milan Kundera in "A Vida não é Aqui",
Capítulo 10 da 5ª Parte " O Poeta tem Ciúmes"
Capítulo 10 da 5ª Parte " O Poeta tem Ciúmes"
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